sábado, 15 de dezembro de 2012

O TEMPO DOS GÊNIOS


A obra de um gênio é como o tempo: a gente tem uma vaga noção de quando ele começou, mas não tem ideia de para onde ele vai, que caminho ele segue ou quais as surpresas que se escondem em sua manta estrelada. Assim é Elis Regina. Quando penso, pretensiosamente, que conheço toda a sua obra, ela "volta" reencarnada em inspiração, e aparece numa obra inédita, graças também ao novo universo paralelo da internet, com a democracia ímpar do youtube. Pois bem: hoje, descobri uma músi
ca chamada Maravilha, de Francis Hime e Chico Buarque, magistralmente interpretada por Elis, numa gravação ao vivo, feita em Lisboa, em 1978. É de arrepiar! tirando novas cartas da manga, Elis se perpetua em sua própria genialidade. Confiram! Em tempo: QUE MÚSICA É ESSA??? Definitivamente, Chico nem precisaria mais de compor, falar ou pensar... o que vier é lucro!!
Abaixo, segue o link para esse momento de pura arte.

https://www.youtube.com/watch?v=LsRqraVYKbY

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

REDESCOBRINDO ELIS

De todos os fãs confessos e inconfessos de Elis Regina, estou entre os que mais sofrem com sua ausência. Ao nos deixar, Elis deixou órfãs a música brasileira e a música mundial.


A chegada de Maria Rita foi uma grata surpresa para mim. Ao ouvir seu CD de estreia, a semelhança vocal e a alma musical de Elis se fizeram presentes e aconchegaram meu espírito. Foi um primeiro momento, necessário, inevitável, imprescindível, em se tratando do nome e ícone envolvido.

Mas isso não durou muito tempo.

Já a partir do segundo trabalho, Maria Rita começou a mostrar sua cara. Ela herdou, sim, uma semelhança vocal incrível com Elis, além da sua ginga e do seu estilo de entrega "rasgada", coisas que são um verdadeiro presente da mãe-natureza.

Mas Maria Rita tem muito mais a oferecer. Ela tem evoluído, ao longo da carreira, de forma séria, consistente e personalizada. Utiliza os dotes vocais geneticamente herdados, mas quem não o faria?? o que se diz, por vezes, com tom de crítica e ironia ("a voz de Maria Rita é parecida com a de Elis") é o que todas as cantoras desejariam ouvir um dia! mas não o farão... porque a genética é implacável. Parecida com Elis, só Maria Rita. Mais ninguém.


Conheço todo o repertório de Elis. Mas não é só isso: conheço cada nuance de sua voz, suas pausas, sua respiração, suas intenções, sua ironia, sua doçura, seu atrevimento. Apesar de nunca ter visto Elis ao vivo, arrisco dizer que sou um de seus maiores conhecedores. Isso, porque conheço a fundo sua obra. E sei do quanto ela era capaz de se doar ao ofício de cantar. Elis não cantava, apenas... ela vivia e tornava vivas as canções.


Compreendi as dificuldades de Maria Rita, no início, quando não queria paralelos com a mãe, quanto à carreira musical. Para uma cantora, não é fácil iniciar uma trajetória sendo filha da maior de todas, de um mito em que, merecidamente, Elis se transformou.

Mas Maria Rita foi caminhando, insistindo, mostrando sua cara. 

Vi praticamente todos os seus shows.

Desde o princípio, facilmente diferenciei Maria Rita (filha) de Maria Rita (cantora). São dois patamares diferentes, embora interajam intrinsecamente.

Quando, por fim, todas as barreiras foram transpostas, e Maria Rita resolveu gravar o repertório de Elis, fiquei em absoluto êxtase. Não porque veria "Elis de volta", mas porque ouviria uma cantora ter a ousadia, a coragem de cantar Elis, independentemente de ser sua filha ou não.

Em Recife, fiquei sem fôlego, desde as primeiras canções.

Eu estava diante de uma cantora madura, que se debruçava num dos mais difíceis e rebuscados repertórios do cancioneiro nacional.

E estava diante de mim uma voz nova, atrevida, grandiosa.

O repertório e o mito de Elis haviam exposto o que Maria Rita tem de melhor: o talento, em seu aspecto mais visceral.

Maria Rita não estava apenas homenageando Elis... isso é o óbvio. Na verdade, ela estava se desafiando, levando seu próprio talento ao limite, buscando seus próprios horizontes.

Sou músico, e sei o quanto é difícil cantar a maioria das músicas do repertório de Elis. Pelo menos, para quem se diz formal e verdadeiramente uma cantora.

E Maria Rita deu conta. Muito mais. Ela foi além de si própria. Duvido que ela própria tenha se dado conta, previamente, de que tinha tanto potencial vocal.

Nos momentos mais difíceis, em que lembrávamos nos vibratos impecáveis e da potência vocal de Elis, Maria Rita estava lá, à altura, talvez um pouco surpresa por descobrir tanto potencial em si própria.

Ouvindo Maria Rita, consegui abstrair completamente a figura de Elis. Estava, diante de meus ouvidos e olhos, uma excepcional cantora, armada com todos os dotes técnicos e emocionais da mãe. 

Respeitosamente, com a humildade dos que se sabem grandes, Maria Rita manteve a linha conceitual das interpretações. E nesse momento, mostra-se ainda maior, por não soar caricata ou replicante.

Maria Rita está no seu melhor e maior momento musical. Relê e revive Elis, não como um rascunho, mas como uma grande artista, que vê, em outra, um caminho a ser seguido, independentemente da relação maternal. 

Viva Elis, viva Maria Rita!


quarta-feira, 13 de junho de 2012

A FORÇA QUE VEM DOS VENTOS








Há momentos tão extremos na vida, que a expressão é quase impossível em palavras. Sempre me perguntei se somos "fortes" ao enfrentarmos certas situações, ou se somos simplesmente compelidos. Em outras palavras, não temos opção, exceto a de permanecer "fortes". Não há saída. Olhando o céu parcialmente nublado dessa quarta-feira, deixo minha mente viajar até um recanto imaginário, onde posso deitar a cabeça no colo de minha mãe, numa volta imaginária a um tempo de leveza e candura da infância. Nessas viagens, vejo minha mãe exatamente como hoje: uma mulher forte, exemplar, inteligente, sábia. A única pessoa sobre a face da Terra que me compreende e aceita plenamente, em todos os detalhes de uma personalidade complexa (não por opção), inquieta (por consequência) e desadaptada (por falta de sorte). A vida bate forte, exatamente nos compartimentos mais preciosos de nossa existência. Como a testar nossa capacidade de permanecer de pé, ou até mesmo vivos. Inutilmente, mas seguem esses testes, vida afora. Pois um pouco de nossa própria vida se esvai em cada grande dor, e a fonte seca aos poucos, inexoravelmente. Até que só nos reste a lembrança. Uma lembrança doce, com a maciez do colo de uma mãe e o perfume de dias perdidos, muito longe, num tempo da delicadeza.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

O Projeto VIVA ELIS nasceu dos filhos da saudosa cantora gaúcha, marcando os 30 anos de aniversário de sua morte. Elis Regina é, ainda hoje, considerada como a melhor cantora que o Brasil conheceu, inclusive por críticos nacionais e internacionais. Teve uma morte prematura, aos 36 anos, mas deixou uma obra marcante, personalizada, irretocável, fonte de referência para todos os cantores e músicos do mundo. Sua filha, a também cantora Maria Rita, envolveu-se no projeto, aceitando, pela primeira vez, o gigantesco desafio de interpretar músicas imortalizadas por Elis. Falar sobre a semelhança entre os timbres é chover no molhado. O que mais chamou a atenção de todos, especialmente a minha, foi a nova série de artifícios vocais e interpretativos utilizados pela cantora, no intuito de se honrar as dificílimas colocações vocais e rítmicas de Elis. E Maria Rita descobriu-se possuidora de mais técnica do que havia demonstrado, até então. Passeando pelo dificílimo repertório de Elis, Maria Rita demonstrou uma incrível segurança rítmica, além de vibratos mais bem colocados e uma voz mais potente, mais solta. O resultado final foi emocionante. Não porque possibilitou a comparação entre as cantoras, mãe e filha, mas por ter mostrado ao Brasil que Elis deixou uma seguidora. Os timbres, a técnica vocal, os gestos e o estilo são parecidíssimos, uma obviedade, em se tratando de mãe e filha. Mas Maria Rita tem suas próprias virtudes, que foram unicamente salientadas e explicitadas nesse show inesquecível.